Dia desses eu passava ali na avenida Rio de Janeiro (tentaram batizá-la como avenida Augusto Franco, mas não teve jeito. Quando o povo quer, é assim!) e lembrava dos tempos de menino. Eu nasci na casa nº 1288, quase esquina com rua Guaporé. Nessa época, não era possível o trânsito de carros. As casas ficavam a uma certa altura, como se fosse uma pequena colina. Descíamos na grama em pedaços de papelão, nos invólucros de cachos de coco, que mais pareciam navios rompendo o mar imenso.

 Na frente, depois da linha do trem, havia um terreno, com minadouros e córregos, popularmente conhecido como “Xoxota da Véia” – era assim mesmo que se chamava. Lá havia um campinho de futebol, cujas traves eram troncos de coqueiro. Certa vez, perdemos para um time de outra zona (era assim que se chamava a divisão de bairros entre os guris) por sete a zero. Como eu era muito pequenininho (acho que tinha uns cinco a seis anos), não quiseram me colocar de primeira. Acho que foi por isso que perdemos feio. Se isso me dói até hoje, imagine os jogadores da seleção brasileira depois da derrota pra Alemanha no Maracanã. Se bem que nós, crianças apaixonadas pelas brincadeiras, tínhamos paixão pelo que fazíamos. Já os profissionais…não sei dizer.

 Enfim… muitas mulheres iam para a “Xoxota da Véia” com as trouxas de roupa equilibradas na cabeça sobre uma rodilha de pano (era o tempo que só mulheres executavam essa atividade!).

 – Quer que eu fale a verdade?

– Diga lá!

– Era um tempo bom!

 A gente também, nas imediações da Rio de Janeiro com Guaporé, brincava de muitas coisas: pega-ladrão, salve-latinha, pembarra ou bimbarra. Mas havia uma que me deixava alucinado: jogar pedra no trem. Claro que eu fazia escondido de minha mãe. Ela já me proibira de fazer isso. Por sinal, quando o trem passava (a linha férrea está lá intacta), ela não permitia que ficássemos na rua.

 – André, o trem chama. Se ficar perto, morre!

 Eu me revoltava contra o trem porque ‘ele chamava’ e lhe atirava pedras nos vagões.

– Téin…téin…téin. Era mais ou menos assim o choro onomatopaico que aquele monstro de ferro deixava sair das paredes dos vagões enfileirados militarmente.

 O trem passando me dava a impressão de imponência, de solidez, de certeza de chegada ao destino. Tudo parava para o trem passar.

 Foi então que me peguei pensando:

 – Por que acabaram com esse meio de transporte tão eficaz, barato, seguro, coletivo?

 Os trens são capazes de dirimir, e muito, o problema do inchaço das cidades por causa do trânsito. O metrô é uma grande saída para esse infortúnio de que milhões e milhões de pessoas padecem diariamente neste país sem rumo.

 E tem mais: por que o transporte de grão não é feito completamente por trens? A quem interessa a utilização das mortais rodovias e do consumo de combustíveis fósseis?

 – Alguém me responda!

 Aracaju é uma cidade plana, possui linha férrea, tem um desenho arquitetônico interessante para a promoção de mais ferrovias e uma consequente fluência mais acentuada com redução do tráfego de carros, caso houvesse um transporte coletivo de qualidade, segurança, conforto e acessibilidade.

 [box type=”warning” align=”aligncenter” class=”” width=””] Sinceramente, como não sou Engenheiro do Havaí, devo ser burro demais para entender que o trem é porcaria, que não há vantagem alguma de mudar o transporte coletivo e que ninguém ganha em manter um serviço rodoviário de baixo nível, com ruas estreitas e esburacadas e horríveis, motoristas tresloucados, superlotação em todas as linhas, um quebra-coco-sem-fim. Eu devo ser surdo, cego, mudo e abestadóóó!

[/box]

 – Garcia, taca uma pedra aí na minha cabeça! Aliás, três!

– Téin…téin…téin!