Dia desses meu vintage 97 deu pane e precisou ir para a UTI – o bichinho necessita de uma repaginada à moda ‘Lata Velha’: – São Caldeirão, rogai por mim!, exclama o dormente veículo. Com a enfermidade do possante, fui aventurar-me nas curvas da estrada dos santos (São Pereira Lobo,  São DIA, Santo Inácio Barbosa, São Grageru, tende misericórdia!). você está pensando que o verbo ‘aventurar’ foi escrito sem um mínimo de cogitare? Sabe de nada, indecente!

Quem não lembra do Indiana Jones e suas mirabolantes aventuras em busca de tesouros perdidos e emoções várias que surgiam com as mais diversas situações criadas em nome da adrenalina? Aracaju tem visto, a cada dia, o surgimento de vários Indianas. Só que, ao contrário do ícone cinematográfico ianque, os nossos aventureiros não pertencem ao mundo glamouroso do cinema. Nossos heróis estão no dia a dia da cidade.

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Quem são esses heróis? Se você não sabe, arrisque-se a percorrer a cidade em um ônibus coletivo. Você se tornará um desses heróis anônimos, vilipendiados pela forma insana, demente e irresponsável com que os veículos são conduzidos, mais parecem os carrinhos de uma montanha russa tresloucada do que ônibus coletivos decentes como deveriam (e devem!) ser.

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As aventuras começam nos pontos de ônibus. Em alguns bairros (como: Lamarão, Bugio, São Conrado, Atalaia, até o Centro e 13 de Julho – imagine isso!), há dificuldade dos motoristas pararem os veículos para acolher os passageiros. Começa com a velocidade – mais parece caminhão com bois do que gente – imposta nas caixas coletivas. A impressão é que estão à cata desenfreada por metro quadrado de asfalto. É desumano, é irracional.

Quando param (a maioria atrasa e deixa as pessoas esperando um boníssimo tempo), assim que o pobre e desgarrado passageiro tira o segundo calcanhar do chão, os velozes motoristas arrastam o ônibus como se estivessem na pole position de um grande prêmio de Fórmula 1. A sensação é que se está iniciando um grande “racha de buzão”. Há quem goste da emoção fruída do balançar subumano do veículo, mas a maioria absoluta reclama, xinga (surge cada pérola sergipana!) e depois sai silenciada pela necessidade absorta de um transporte coletivo. Afinal de contas, trabalhar é preciso!

Depois das paradas e das subidas inglórias e nervosas, vem a magnífica situação dos apertos e da velocidade empreendida pelos pilotos, quer dizer, motoristas. O empuxo (continuidade de movimento) gerado pelas freadas geralmente bruscas cria uma espécie de “ola”. Os passageiros amontoados, neste instante, sabem o que uma sardinha sofre ao ser enlatada.

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Você, caro(a) leitor(a), pode até julgar que há muitas hipérboles neste texto, que a realidade não é bem assim e coisa e tal. Todavia garanto que, no mínimo, vossa senhoria nunca teve o desprazer de sentir a sensação terrível do ônibus fazendo a volta ali na praça para entrar no terminal do Mercado Central. Ou não encarou uma viagem que exija entrada em curvas bem fechadas, quando o passageiro sente que vai flutuar, a exemplo da Hermes Fontes para entrar na Barão de Maruim.

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E olhe que o assunto abordado aqui só delimita um dos problemas vividos pelos passageiros valentes e aguerridos. Poderíamos mencionar, ainda, a condição péssima dos ônibus, a superlotação constante, o valor da passagem e a escassez de troco, as escadas de embarque e desembarque ótimas para causar problemas de coluna (a altura só para gigantes), o não cumprimento de vagas para idosos e deficientes…   São Cristóvão protege os motoristas. E quem protege os passageiros?

Se os donos de ônibus fizessem um “passeio” para conhecer a realidade de quem utiliza o serviço de transporte coletivo em Aracaju, talvez houvesse a possibilidade – mesmo remota – de mudar algo em prol dos nossos Indiana Jorge, Indiana João, Indiana Célia, Indiana Paula, Indiana Carlos, aventureiros laboradores de cada dia.

A sugestão é boa, uma vez que a palavra ônibus deriva do latim omni bus, que significa “para todos”. Porém, com base no que é vivenciado hoje, poderíamos mudar o sentido: para todos que precisam e não têm outra alternativa de transporte.

Vai encarar?